quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Com Strauss (crônica de um Brasil sem efeitos especiais)



Bons tempos quando a maioria das vitrolas brasileiras tocavam em 75 rpm o "Danúbio Azul" de Strauss. Faltar esta valsa nas casas era como não ter um sofá na sala de estar ou uma cama sem colchão. Lembro-me ficar sentado no cavalinho sentindo a sensação de felicidade do meu pai que a ouvia e sonhava, e sorria. As valsas de Strauss se constituiam no ideal de beleza de uma época.

A vitrola chegou quase junto da televisão. Lá em casa, por volta de 1958.  Eu tinha quatro anos de idade. Era muito grande o facínio da imagem em movimento na sala de casa e onde podia passar o mundo, era muito grande, mas com meu pai não ia além do uso semelhante a qualquer eletrodoméstico. A televisão, por mais mágica se apresentasse, não sibstituíra o espaço para a música.

Sábado ou domingo à tarde uns e outros vizinhos vinham ouvir algumas músicas, as crianças vinham acompanhando-as. Primeiramente elas se sentavam na sala junto dos adultos e ali ficavam quietinhas, dominando a ansiedade de brincar e farrear. Este era o passaporte para que o dono da casa, o pai, vendo-as bem comportadas, finalmente me incumbisse de levá-las para brincar no quintal.

Era-nos diferente, especial, sublime, brincar ouvindo o som das valsas de Strauss vindo lá da sala. Nem sei se hoje consigo traduzir aquele sentimento. Gosto azul de céu, da harmonia em requinte, da alegria  lúdica, da paz em sentimento. Um estado de beleza composto de pequenas coisas, de pequenos gestos como o acompanhamento de bolo com café, e simples assim. Isto era tudo, era o todo.

Enfim, vejo que hoje as pessoas em geral já não sabem criar estados de beleza. Perdeu-se a simplicidade espontânea. Já não se busca a felicidade, mas o estar contente e, para isto, uma latinha de cerveja é tudo. É triste ver a moçada andando pelas ruas com litrão de destilado passando de mão em mão. Mas chega, isto está dando interferência ao gosto do belo.

Sozinho, e de fone de ouvido na sala de concerto em frente ao notebook, dou novo play nesta valsa de Strauss e com a felicidade e a honra de a ter compartilhado com os amigos deste meu Poemas de Sol.



Jairo Ramos Toffanetto

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