sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Mário de Sá Carneiro _Partida (trechos) _Ápice (integral)

Em Sá-Carneiro o que mais gosto da arte poética hoje esquecida ou mau sabida, e que eu na mocidade descobri(senti) com o nosso poeta Castro Alves: o prazer do declame poético, seu ritmo, tempo, palavras em seda alinhavo, sonoridade e aonde o entendimento fica como pano de fundo. Então, mergulhado no belo do fazer artístico, aqui eu integro ou passo e... depois, encontro-me com o poeta; ali eu vivo, lá estou, acolá vou e voo.É o que me perpassa em seus versos: 


Fernado Pessoa e Sá-Carneiro















DISPERSÃO
_Partida
(link de acesso ao poema na íntegra 
e mais outros vinte e três)

(...)
O que devemos é saltar na bruma,
Correr no azul à busca da beleza.
                   
                           [...]

Miragem roxa e nimbado encanto -
Sinto meus olhos a volver-se em espaço!
Alastro, venço, chego e ultrapasso;
Sou labirinto, sou licorne encanto.

Sei a Distância, compreendo o Ar;
Sou chuva de ouro e sou espasmo de Luz;
Sou taça de cristal lançada ao mar,
Diadema e timbre, elmo real e cruz...

Mário de Sá Carneiro
(Paris, fevereiro de 1913)

Ápice
O raio do sol da tarde
Que uma janela perdida
Refletiu
Num instante indiferente —
Arde,
Numa lembrança esvaída,
À minha memória de hoje
Subitamente…
Seu efêmero arrepio
Ziguezagueia, ondula, foge,
Pela minha retentiva…
— E não poder adivinhar
Porque mistério se me evoca
Esta idéia fugitiva,
Tão débil que mal me toca!…
-Ah, não sei porquê, mas certamente
Aquele raio cadente
Alguma coisa foi na minha sorte
Que a sua projeção atravessou…
Tanto segredo no destino de uma vida…
É como a idéia de Norte,
Preconcebida,
Que sempre me acompanhou…
Mário de Sá Carneiro
Portugal 
19 Mai 1890 // 26 Abr 1916 
Poeta/Contista/Ficcionista 


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